Como ocorre a aprendizagem nos animais? Tudo o que eles fazem é consequência unicamente da sua carga genética? Suas atividades são realizadas somente pelo instinto ou eles são capazes de aprender? Há uma espécie de ave com características interessantes: pinyon jay (Gymnorhinus cyanopephalus); ela pertence à família corvidae e costuma comer sementes do pinheiro pinyon pine em grande quantidade. Mas elas não apenas consomem, também plantam suas sementes como jardineiros!
Os pinyon jay são também conhecidos como gaios, e podem formar organizações sociais com bandos superiores a 500 indivíduos. Eles vasculham a paisagem buscando alimento, em especial sementes de pinheiro. Ao encontrá-las, carregam mais de 50 de uma só vez – não com o bico, mas por meio de uma estrutura expansível do seu corpo: o esôfago.[2] As sementes que não são consumidas por eles são escondidas no solo para estoque em locais especiais.
Estudos estimam que, de setembro a janeiro, 250 gaios enterram cerca de 4,5 bilhões de sementes.[1] Aquelas que não forem reencontradas por eles, meses depois poderão originar novas plantas. O interessante é que essas sementes não costumam ser enterradas por eles em locais aleatórios, mas em áreas abertas, próximas a pilhas de arbustos e também árvores caídas – com condições apropriadas para o desenvolvimento de novas plantas (onde há disponibilidade de nutrientes, proteção contra ventos fortes, sol, etc.).
Como essas aves conseguem encontrar as sementes vários meses após escondê-las? Tal ação envolveria algum processo de aprendizagem?
Os gaios as armazenam em períodos de abundância – fim do verão e outono. Eles consomem plantas, nozes, frutas pequenas e sementes de pinheiro, mas, no fim do inverno, esses alimentos estão indisponíveis; assim, eles recuperam as sementes que foram armazenadas, encontrando-as com grande precisão. Na época de inverno, a dieta deles se reduz quase unicamente (95%) às sementes de pinyon pine.
Os gaios possuem uma memória espacial ótima, utilizam pontos de referência para localizar as sementes escondidas, recuperando não apenas o alimento, mas também uns dos outros (pela observação).
A aprendizagem pode ser classificada como “modificação adaptativa do comportamento com base na experiência” (p. 97).[3] Nos animais, a aprendizagem não gera alterações de comportamento pelo simples desejo de mudar; ela ocorre em casos de imprevisibilidade ambiental relevantes à espécie.
“A capacidade de aprender depende da organização do sistema nervoso estabelecida durante o desenvolvimento, seguindo instruções codificadas no genoma” (p. 1.138).[4]
Até mesmo nos insetos podemos identificar organismos com grande capacidade de aprendizagem. Isso acontece com as abelhas melíferas na busca por alimentos. Elas localizam quais “odores, formas e cores estão associados às diferentes flores produtoras de pólen ou néctar; em que momento particular do dia uma espécie de planta estará com as flores abertas; como retornar à colmeia após uma expedição de forrageio”, etc. (p. 98).[3]
De acordo com o autor, a seleção natural favoreceu o cérebro das abelhas melíferas, possibilitando que elas sejam capazes de incorporar informações importantes de variáveis ambientais, modificando atividades genéticas nas células cerebrais e alterando comportamentos do indivíduo, facilitando a exploração dos recursos das regiões vizinhas durante o forrageamento.
Na família dos corvos (Corvidae) esses comportamentos de aprendizagem espacial em resposta às pressões ecológicas específicas também ocorre. Neles, a aprendizagem espacial acima referida envolve a formulação de mapas cognitivos – “uma representação no sistema nervoso do animal da relação espacial entre os objetos ao seu redor” (p. 1.139).[4]
A adaptação de um organismo ao ambiente pode ser melhorada a partir da sua capacidade de aprendizagem, pelo estabelecimento de uma memória espacial do ambiente no qual vive.[4]
Dentre os Corvidae, quatro espécies possuem a predisposição para estocar alimentos, o que só é possível graças à ótima capacidade espacial deles. A aprendizagem acontece para que eles consigam solucionar problemas especiais em seu ambiente.
A época de escassez inicia-se cinco meses após o período de estocagem. Os machos apresentam probabilidades maiores do que as fêmeas de reencontrar as sementes escondidas. Isso acontece devido à responsabilidade deles em prover alimento para elas e seus filhotes. Assim, machos possuem memória melhor a longo prazo.
A ação de longos períodos de tempo, unindo-se à seleção natural com mutações genéticas seria a receita-chave para a geração de organismos com esse nível de complexidade?
(Moema Rubia Patriota é bióloga pela Universidade Estadual de Londrina, com especialização em Gestão, Licenciamento e Auditoria Ambiental pela UNOPAR, e MBA em Gestão Ambiental pela UFPR. É a idealizadora do Projeto: @polegarverdeambiental no Instagram)
Referências:
1. Providential planting, JOHNSON James J. Scofield.
2. The Coronell lab: allaboutbirds.org/guide/pinyon_jay/overview
3. ALCOCK, John. Comportamento animal: uma abordagem evolutiva (9 ed.).
4. REECE, URRY, et al. Biologia de Campbell.